Há umas semanas atrás, o programa do Dr. Oz fez um segmento com a actriz Jennifer Esposito, que foi diagnosticada com a doença celíaca em 2009. Não sendo uma actriz de primeiro plano em Hollywood, é, contudo, uma cara conhecida dos ecrãs portugueses tendo participado em séries como “Spin City” e “Samantha Who” e filmes como “Crash” e “Summer of Sam”.
Após o diagnóstico, dedicou-se à divulgação da doença e encontra-se a escrever um livro sobre a sua luta para encontrar respostas, assim como um livro de receitas sem glúten. Está a desenvolver uma linha de produtos sem glúten e criou uma organização chamada Jennifer’s Way para educar e promover um estilo de vida mais saudável. No site da organização, apresenta vários conteúdos, inclusive a sua história, que aproveitei para traduzir e reproduzir neste post.
"26 Graus, um dia ensolarado. Eu não tinha reparado em nenhum destes factos naquele dia. Naquele momento, eu tremia, ainda que coberta de suor enquanto estava sentada nua debaixo de uma bata de papel a ser picada e apertada por mais um médico. Tinha acabado de passar a última hora no consultório médico recapitulando cada detalhe do meu historial médico, antecedentes pessoais, antecedentes familiares, sintomas actuais, bem-estar e estado de espírito. Agora, era o momento da verdade, o exame!
Ela verificou a minha pulsação e temperatura, passou as mãos pelo meu corpo, ouviu os meus batimentos cardíacos, tudo de uma forma muito rápida, em cinco minutos. Escreveu algumas coisas na minha ficha, respirou fundo, tirou o estetoscópio e delicadamente colocou a mão nas minhas costas. O meu corpo enrijeceu ao seu toque, mas derreteu de exaustão. Foi isso? Será que ela o encontrou? Um nódulo, um alto, algo inchado que explicaria anos de doença, sem respostas, sem explicação. Era cancro? Eu estava a morrer? E se sim, quanto tempo tinha?
Eu nem sequer me preocupava com os factos naquele momento. Eu estava tão feliz por finalmente ter algumas respostas. Na verdade, consegui por um sorriso no rosto em face à minha desgraça iminente. Olhei para ela com esperança. Ela sorriu de volta, infelizmente, e disse: "Jennifer, você quer se matar?"
Olhei para ela fixamente. Eu não tinha palavras. Apenas lágrimas a rolar pelo meu rosto. Não podia acreditar no que acabara de ouvir. Será que ela, realmente, disse isso? Eu sei que lhe disse que estava deprimida, mas isso foi porque eu estava sempre doente. Isso não deprime qualquer um? Mas matar-me? Era isso que estava escrito no meu rosto? A minha mente corria e o meu âmago gritava.
Eu não tinha acabado de descrever, durante uma hora, o que eram já sintomas debilitantes? Sintomas que carregava comigo, pela minha vida, como um peso que agora parecia igual a 100 toneladas. Dormir cerca de 13 horas por noite e acordar exausta, problemas de estômago constantes, ataques de pânico insanos, dores nas articulações, joelhos débeis, fraqueza extrema, amarelecimento da pele, dores de cabeça intensas, dormência, formigueiro, e cabelos e unhas tão fracas que partiam com um simples toque. Para não mencionar a massa enorme que agora despontava no meu pescoço, logo abaixo da orelha.
Apesar de tudo isso, eu tinha conseguido tornar-me numa actriz de sucesso, trabalhando muito. Quase 15 anos como actriz a trabalhar num negócio impiedoso que faria o homem mais forte desmoronar. Tinha casa própria aos 25 anos de idade. Eu era uma amiga, uma tia, uma madrinha, uma irmã e uma mulher de respeito, aos 35 anos de idade. Tinha viajado para o estrangeiro sozinha. Tive relações boas e más. Chorei, aprendi e recebi. Nunca tive um transtorno alimentar, trabalhei fora e nunca tomei uma droga na minha vida. Aprendi a meditar e desenvolvi um centro espiritual forte. Estive no fundo do poço e sabia contar as minhas bênçãos pelo que tinha e não pelo que não tinha.
No momento, porém, era muito difícil contar as bênçãos quando se está cansado demais para sequer ver. Isto parece uma pessoa com uma constituição fraca? Alguém que iria se matar e perder tudo o que tinha alcançado, trabalhado tão duramente? Está a sugerir que os meus sintomas não são reais, como tantos outros antes? Que, de alguma forma, tudo isso é devido ao stress ou, talvez, a algum tipo de desequilíbrio? Já me ofereceram antidepressivos como Valium, Ativan, Klonopin, em número suficiente para começar um cartel de drogas de pequeno porte. Eu tinha sido testada para Lúpus, doença de Lyme, hepatite, artrite reumatóide e uma série de outras doenças. Tudo negativo. Para não mencionar as numerosas colonoscopias, enemas de bário, exames de ressonância magnética, tomografia computadorizada, raios-x, testes de nervos e tanto sangue retirado que poderia ter enchido um rio. Já me disseram que tinha Epstein Bar, síndrome do intestino irritável, fadiga crónica e fui tratada para um parasita que nunca foi realmente encontrado. Para tudo isto, foi-me dado algum tipo de medicação e uma sugestão de ver um terapeuta. Disseram-me que tudo poderia ser um tipo de depressão.
Como é que quando os médicos não conseguem explicar os seus sintomas, de alguma forma, passa a ser algo na sua cabeça? Eu estava tão cansada de explicar e pedir às pessoas para me ajudarem. Eu sentia-me tão ignorada! Eu não sou louca! POR FAVOR, NÃO me mandem embora com uma receita de Valium e o número da sua TERAPEUTA FAVORITA! EU NÃO PRECISO DE ANTIDEPRESSIVOS, PRECISO DE AJUDA !!!!!!!!! Nada, o silêncio, um pequeno suspiro é tudo o que saiu de mim, isso e lágrimas.
Há algo que acontece consigo quando se sente ignorado durante tanto tempo. Você morre um pouco. Eu estava fisicamente, mentalmente e espiritualmente acabada. Estava pronta para aceitar a receita da praxe, juntamente com o diagnóstico de louca e ir embora. Estava farta de lutar por uma resposta e provar a minha sanidade. Então, do nada, ouvi uma pequena voz dizer: "Eu preciso de ajuda. Preciso da sua ajuda, por favor. "
A voz que eu mal reconheci como minha. Foi uma vulnerabilidade que eu nem sequer sabia que existia. Eu implorava pela minha vida com a energia que fui capaz de juntar e deixei a responsabilidade a seus pés. Ela pôs a sua mão na minha mão trémula, olhou-me nos olhos e disse: "Eu vou ajudá-la. Vou descobrir o que está errado. "
Talvez ela realmente me tenha ouvido. É incrível como o espírito humano funciona. Mesmo que eu já tivesse ouvido essa frase antes, de alguma maneira, acreditei nela. Ela levou o que pareciam ser dez frascos de sangue, vesti-me, peguei nos meus 50 quilos e fui para casa esperar.
Duas semanas mais tarde, a médica ligou e disse que eu tinha uma coisa chamada doença celíaca. Disse que era a contagem mais alta que ela já tinha visto. A descarga de adrenalina correu através do meu corpo, oh, tão cansado. "Acharam-no, eu sabia, algo está e tem estado errado". Uma segunda onda de adrenalina: o que raio é a doença celíaca? A médica disse-me que era uma doença digestiva que tinha a ver com o glúten e que eu precisava rapidamente de uma endoscopia. De imediato, ela pôs o meu gastrenterologista ao telefone connosco e explicou as suas descobertas. O comentário dele quando ouviu o que ela tinha a dizer foi "O quê? Realmente? Nunca pensei testá-la para isso… ". Eu fui paciente dele durante cinco anos.
A minha cabeça girava tanto naquele momento que nunca disse o que teria gostado de dizer ao meu gastrenterologista dos últimos cinco anos. Queria dizer algo como isto: "Por que diabo é que eu nunca o ouvi falar DISTO antes". Terminamos a conversa com um número de um nutricionista, instruções para parar de comer glúten, e uma prescrição para um procedimento chamado endoscopia. Fiquei espantada, assustada, feliz e perplexa, tudo ao mesmo tempo. Procurei durante anos para encontrar uma resposta para todas as minhas doenças inexplicadas. Fiz perguntas, boas perguntas aos profissionais. Li tudo o que podia sobre saúde e nutrição. Até comecei uma dieta macrobiótica e vegan, a dada altura. Logo, eu estava ciente da importância da relação entre alimentação e saúde. Por que é eu nem sequer ouvi falar disto, a doença celíaca?? Fui imediatamente à internet e o que eu encontrei, manteve-me colada ao sofá durante horas. Li que tinha uma doença auto-imune e o que acontecia com o meu corpo quando eu ingeria glúten. O dia inteiro e o próximo, percorri a internet para saber "como tratar" e "o que fazer". No pouco que encontrei, tudo dizia a mesma coisa - comer sem glúten. O que diabo significa isso? Eu não conseguia compreender que os restos de massa no meu frigorífico naquele momento já eram. Para sempre.
Entrei em contacto com a nutricionista. Ela explicou um pouco melhor e disse-me para imprimir uma lista do que eu não poderia comer e colá-la no meu frigorífico. Também disse que eu precisava de limpar a minha casa, de glúten ou qualquer coisa que tivesse tocado em glúten. Ela recomendou que eu fosse vista de imediato por este "médico espectacular", em Nova Iorque que se especializou nisso. Mas levava semanas, talvez meses para conseguir consulta. Felizmente, ela conhecia-o e disse que iria fazer uma chamada. Recomendou que tomasse alguma vitamina D e sugeriu que eu pudesse sentir uma desintoxicação ligeira. Desintoxicação… a sério?
Imediatamente, saqueei a minha casa. Potes, panelas, torradeiras, todo o conteúdo dos meus armários estava agora no lixo. A minha cozinha estava vazia, excepto para as listas dos alimentos com glúten. Estes papéis que se supunha irem para a porta do frigorífico, cobriam não só este, mas os três armários ao lado. Todos os meus produtos, sabonetes, loções, champôs, pasta de dentes, tudo parecia ter este material, o glúten.
O que restava? Havia alguma coisa lá fora que não contivesse essa substância? E a minha busca começou.
Digo apenas isto, os quatro meses seguintes foram um inferno absoluto. Tentar navegar por este mundo novo era debilitante. Para não mencionar a "desintoxicação ligeira" que a nutricionista disse que eu poderia sofrer. Horrível. Tremores tão graves que o meu corpo todo se movia. Uma névoa no cérebro, cansaço, suores nocturnos, ataques de pânico extremos, sensibilidade à luz, dores articulares, dores de cabeça e, em seguida, neuropatia. Tudo levou a um telefonema para outro médico. Que não me deu respostas. Isto quando fui levada para o hospital pelo o que parecia ser uma reacção alérgica grave a Deus sabe lá o quê, e a enfermeira perguntava-me o que estava a acontecer, que eu disse que achava que estava a passar por uma desintoxicação da doença celíaca. Ela disse: " você tomou o seu remédio?". Olhei para ela, com o meu corpo agitado e a voz a tremer e disse: "não há medicação para a doença celíaca." Ela respondeu: "Oh sim, certo. Espere, e o que é a doença celíaca? "Eu estava num hospital altamente considerado em Miami. O QUÊ? Percebi que estava por minha conta. Não ajudou quando o médico chegou e disse que gostaria de me manter lá durante a noite para controlar a minha tensão arterial, mas não podia porque não tinha nada para me alimentar. Não havia nada PARA ME ALIMENTAR NUM HOSPITAL QUE NÃO CONTENHA GLÚTEN??
Enquanto estava ali a encharcar em suor a bata e os lençóis, percebi que, se eu sobrevivesse a aquilo, teria de fazer algo.
Este site tornou-se uma ideia, porque se ajudar uma só pessoa a se sentir compreendida, ouvida, justificada ou acompanha, então cumpriu o seu propósito. Veja, quando eu percebi a falta grave de informações, e a grande desconsideração geral para com esta doença e as pessoas que dela padecem, eu virei-me para si. Falei com celíacos noutros fóruns, como o que espero que tenhamos aqui. Eles entendem. Lembro-me da primeira vez que senti a neuropatia a chegar. Estava deitada no meu sofá e, de repente, não sentia todo o lado direito do couro cabeludo, depois o lado direito do rosto, e, por fim, os meus braços. Estaria a ter um ataque cardíaco?
Estava tão cansado de ouvir tantas respostas ridículas de médicos ou nenhuma resposta, que decidi me acalmar (embora eu estivesse em pânico) e procurar neuropatia no Google. Encontrei, alguém falava exactamente disso. Era outra pessoa que lidava com a doença celíaca e contava exactamente os mesmos sintomas que eu. Quando abri o link, encontrei um fórum sem glúten para celíacos. O meu mundo mudou. Eram tantos como eu, e sugeriam o que eles tinham feito para se sentirem melhor. Isso é tudo o que queremos. Sentirmo-nos melhor. Comer melhor. Ter melhores opções e ser ouvido.
Eu ouço-o e eu estou aqui para ajudar!
É a minha missão.
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