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Encontrei no site espanhol Foro de Celiacos uma referência a um texto de um médico gastrenterologista, o Dr. Rodriguez Saéz, que consegue, em 11 páginas reunir todo o conhecimento actual sobre a doença celíaca, sustentado por uma boa pesquisa bibliográfica. Sendo assim, na minha modesta opinião, este texto deveria ser de leitura obrigatória para todos os médicos portugueses, em particular médicos de família e especialistas em medicina interna e gastrenterologistas que acabam por ser os que lidam mais com os problemas ligados ao glúten. De leitura obrigatória também para os intolerantes ao glúten (e candidatos a) pois ser um paciente informado, hoje em dia, é vital para uma rápida resolução dos sintomas. Deixo aqui traduzida a última parte do texto em que o autor sumariza os temas abordados anteriomente.
"1. Os médicos em geral, independentemente da sua especialidade, deveriam conhecer melhor as características clínicas usuais da doença celíaca (DC), bem como as suas variadas formas de apresentação, pois é muito comum (afectando 1-2 % da população geral), e incluí-la no diagnóstico diferencial não só de muitos processos digestivos, mas também em muitos outros que são extra-intestinais.
2. É essencial para o diagnóstico a recolha duma história clínica cuidadosa, incluindo história pessoal, desde a infância do paciente, relacionando os seus problemas com a ingestão de alimentos ricos em glúten, bem como o desenvolvimento de uma história familiar completa de DC e uma pesquisa das doenças mais frequentemente associadas como rinite crónica, episódios recorrentes de faringo-amigdalite, otite, sinusite, asma brônquica e de outros processos imunológicos de natureza alérgica.
3. Realizar uma pesquisa sistemática de DC em pacientes pertencentes a grupos de alto risco, como aqueles com anemia ferropriva, especialmente se esta aparenta ser refractária à terapia de substituição de ferro oral, e executar com biópsias duodenais múltiplas de uma forma rotineira durante procedimentos endoscópicos do tracto gastrointestinal superior realizados em pacientes com dispepsia, anemia ou clínica sugestiva.
4. Na presença de hipertransaminasemia constante e ausência de doença do fígado conhecida, especialmente quando os marcadores virais são negativos, deve-se levar a cabo uma despistagem sistemática de DC, uma vez que a presença de elevação flutuante da transaminase ocorre em cerca de 10% dos casos. Essa mesma abordagem também é aconselhável a pacientes com colestase crónica dissociada.
5. Em pacientes diagnosticados com diabetes tipo 1, deve-se considerar a sua possível associação porque é relativamente comum e o estabelecimento de uma Dieta Isenta de Glúten (DIG) facilita um melhor controlo da diabetes, reduzindo as necessidades de insulina. Se houver distúrbios endócrinos associados, como hiper ou hipotireoidismo, ou tireoidite com função normal, convém descartar uma DC que a possa acompanhar.
6. Deve-se recordar que o rastreio sistemático de DC através da simples determinação de marcadores sorológicos habituais, tais como a tTG, é claramente insuficiente, uma vez que esta encontra-se elevada em apenas um terço dos pacientes adultos. A sua sensibilidade é aumentada nos casos em que há associação a atrofia das vilosidades e tal ocorre predominantemente em crianças. Portanto, em cerca de 70% dos adultos celíacos, geralmente a tTG é negativa, ou está minimamente elevada.
7. A biópsia duodenal pode ser normal ou mostrar apenas alterações mínimas, com rara presença de atrofia das vilosidades em adultos com doença celíaca. É necessário enviar várias amostras de biópsias realizadas em diferentes locais do duodeno (mínimo quatro) bem orientadas para um patologista perito na interpretação de pequenas alterações que utilize rotineiramente a classificação de Marsh e a especifique claramente nos seus relatórios anatomopatológicos das biópsias duodenais.
8. É importante determinar os marcadores genéticos de DC, do tipo de HLA-II, sempre que possível, uma vez que podem ser úteis em casos de difícil diagnóstico, sendo indispensáveis na realização de estudos familiares. Deve notar-se que ter uma DQ2 (+), é uma condição necessária, mas não suficiente para o aparecimento da doença e que existem outros marcadores genéticos que ainda não são bem conhecidos hoje. No entanto, a sua determinação tem um valor negativo predictivo elevado para o diagnóstico de DC.
9. Em casos duvidosos, está plenamente justificado estabelecer uma DIG e segui-la durante seis meses, pelo menos, realizando depois um seguimento clínico e analítico adequado para verificar a resposta obtida (diagnóstico "ex-iuvantibus”).
10. Em todos os serviços de gastrenterologia em hospitais de referência, deveriam existir unidades de monografias dedicadas em exclusivo ao estudo e tratamento de pacientes com doenças do intestino delgado, compostas por pessoal formado para lidar com todas as causas que estão incluídas na síndrome de má absorção, assim como processos malignos que podem afectar o intestino delgado, também equipadas com modernas técnicas endoscópicas, tais como a vídeo-cápsula e a enteroscopia de duplo balão, para estabelecer correctamente todos os diagnósticos e tratamentos próprios a esta região do tracto gastrointestinal, que até recentemente era considerada uma área escura com poucas patologias.
11. Ainda em perspectiva e todas em fase experimental, existem algumas drogas que tentam impedir ou bloquear os efeitos tóxicos e imunológicos do glúten e dos peptídeos associados ao nível do intestino. Todas apresentam um início muito promissor em serem eficazes no futuro, enquanto terapia para esta doença complexa. Estamos ainda num estado inicial de desenvolvimento e, portanto, bastante longe de uma possível aplicação de um ou mais delas, pois ainda têm que passar por todas as fases de avaliação experimental, toxicológica e clínica e, especialmente, demonstrar uma eficácia clara a médio e longo prazo, bem como um bom perfil de segurança."
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