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quarta-feira, 9 de julho de 2014

Repercussões da moda da dieta sem glúten

Imagem retirada da Net
O artigo recente do jornal norte-americano Washington Post que trago hoje retrata uma realidade ainda distante em Portugal: o lado negro da dieta sem glúten, em que aqueles que fazem a dieta por motivos de saúde são ridicularizados e comparados aos adeptos das dietas da moda que a fazem (mal, na maior parte do tempo) porque sim. Esperemos que não chegue a tanto no nosso rectângulo de terra junto ao Atlântico.

"Começou a repercussão contra a dieta sem glúten
As crescentes fileiras de americanos que adoptam dietas sem glúten têm dado origem a uma outra tendência emergente: aquela das pessoas que acham tudo isto uma patetice. (…)

David Klimas tem um amigo que, recentemente, passou a comer sem glúten, um desenvolvimento que este agente imobiliário de 46 anos confirma revirando os olhos. Ele acha que a moda da dieta sem glúten é apenas uma moda passageira, promovida pelas empresas de alimentos "como uma forma de ganhar dinheiro": "na década de 50, todos tinham úlceras", diz ele. "Depois, foram os problemas nas costas. Agora, é o glúten."

A abstinência ao glúten tem crescido dramaticamente nos últimos anos. De acordo com uma pesquisa do Grupo NPD, uma empresa de pesquisa de mercado, quase um terço dos adultos dizem que estão a tentar eliminar ou reduzir o glúten, uma combinação de proteínas encontrada no trigo e outros grãos. Este movimento gerou uma indústria de alimentos em expansão no valor de pelo menos 4 mil milhões de dólares e, talvez até, mais de 10 mil milhões - e crescendo. Corredores inteiros nos supermercados são dedicados à dieta. Cadeias de restaurantes, incluindo Bob Evans, Hooters e, impressionantemente, Uno Pizzaria e Grill, oferecem menus sem glúten. Feiras dedicadas a produtos sem glúten surgiram em todo o país. Bares usam ícones no menu para designar as cervejas sem glúten.
(…)

Cerca de 1 por cento da população americana sofre de doença celíaca, de acordo com a Fundação Nacional para a Consciencialização Celíaca. Esta é uma doença confusa na qual o consumo de glúten provoca danos no intestino delgado e interfere com a capacidade do corpo para absorver vitaminas. Outras pessoas são sensíveis ao glúten e têm reacções negativas ao consumi-lo, mas não têm doença celíaca. As pessoas que têm doença celíaca são, muitas vezes, mal diagnosticadas até que a causa dos seus problemas de saúde - que podem incluir problemas digestivos, erupções cutâneas, fadiga, dores de cabeça e dor nas articulações - é identificada. O único tratamento para a doença é desistir do glúten.

Tem havido um esforço concertado para aumentar a consciencialização sobre a doença celíaca, para que aqueles que vivem sem o diagnóstico correcto possam chegar ao fim do seu sofrimento. Mas algumas pessoas acreditam que este impulso levou a que os recém-convertidos ao sem glúten acreditem que têm uma doença que, na realidade, não têm. "Eu realmente acho que ele continua a ler sobre o assunto e convenceu-se de que é intolerante ao glúten", disse Klimas do seu amigo.

A reacção à dieta sem glúten chegou a um ponto alto no mês passado, quando o comediante Jimmy Kimmel comentou no seu show de fim de noite que, em Los Angeles, o glúten é "comparável ao satanismo", e enviou uma equipa de filmagem para perguntar aqueles que fazem uma dieta sem glúten se realmente sabiam o que é o glúten. (A maioria não sabia.) A apresentadora Chelsea Handler e uma descontente Charlize Theron desconstruíram a questão ao vivo após Handler ter enviado cupcakes sem glúten aos seus amigos, onde se inclui Charlize Theron, durante as férias de Natal. "Eu só acho que se vais enviar enviar um presente, que seja agradável", reclamou Theron, que disse que os bolos sabiam "a papelão."

Daniel Leffler, director de pesquisa do Centro Celíaco no Beth Israel Deaconess Medical Center, em Boston, disse que entre 2 a 3 milhões de americanos relatam manter uma dieta isenta de glúten, e cerca de 10 por cento desse grupo tem doença celíaca. O número de pessoas com a doença está a aumentar - dobrando a cada 30 anos, em ritmo com outras doenças auto-imunes como a diabetes tipo 1-, mas o crescimento dessa população é largamente superado pelo aumento explosivo em pessoas que adoptam a dieta por outras razões, incluindo a perda de peso. Isto levou a que Leffler chamasse a isto o paradoxo sem glúten: "A maioria das pessoas que estão em dieta isenta de glúten não têm doença celíaca, e a maioria das pessoas que têm a doença celíaca, não sabem que a têm e não comem glúten."
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Jessie Dankos, gestora de bolsas de 24 anos de idade que vive em Arlington, Virgínia, sentiu-se mal por uma mulher que recentemente encontrou num casamento que tem uma reacção tão grave ao glúten que tem de verificar os rótulos do seu shampoo para ter a certeza de que este não contém vestígios da substância. Mas Jessie Dankos tem menos empatia pela sua colega de quarto que se auto-diagnosticou e que, por vezes, olha ansiosamente para bolos e espera simpatia por não os poder comer. "Mas, depois, às vezes, ela volta para casa dos bares e traz uma fatia de pizza", diz.

(…) Hannah Glassman, disse que tentou eliminar o glúten da sua dieta durante alguns meses. O seu nível de energia parecia melhorar, disse, mas achou estranho não comer glúten em eventos sociais, como happy hours, onde as pessoas querem compartilhar alguns fritos. Assim, ela tornou-se menos rigorosa e, ocasionalmente, permite-se um pouco de glúten. Neste dia, escolheu uma salada de massa para o almoço. "Provavelmente, vou estar um pouco cansada quando voltar para o escritório", disse ela. "Mas é difícil dizer se é do glúten ou do calor."

Shira Kraft, directora associada de Hemphill Fine Arts e autora do Glutie Foodie, um blog que acompanha as suas aventuras culinárias à volta da cidade, foi diagnosticada com a doença celíaca há quase quatro anos. Ela diz que o movimento sem glúten tem sido uma faca de dois gumes para as pessoas que têm a doença. Por um lado, é óptimo ter mais - e muito mais saborosos - produtos para escolher. Mas também diz que porque tantas pessoas começaram uma dieta sem glúten, a sua condição é, por vezes, levada menos a sério. "Eu certamente sinto que tenho que me defender", diz Kraft, de 31 anos de idade. "Fico envergonhada quando digo que sou alérgica ao glúten, porque sinto que as pessoas reviram os olhos. “Só mais um, a aderir à moda.”

E, embora muitos restaurantes atendam clientes sem glúten, alguns colocam limites sobre o quão longe irão para acomodá-los. Peter Pastan, dono dos restaurantes Etto, Obelisco e 2Amys, traça a linha na pizza sem glúten. Não que as pessoas não a peçam. Elas pedem - quase todas as noites. "É suficientemente difícil fazer uma boa pizza", diz Pastan. Então, ele deu aos seus empregados uma resposta padrão para as investigações sem glúten: "Eles dizem: você está absolutamente certo. Eu compreendo perfeitamente o que me diz, mas o meu chefe é louco e não há nada que eu possa fazer acerca disso. "

Hanson Cheng não presta muita atenção aos inimigos dos sem glúten. Sentindo-se fora de forma há um par de anos atrás, juntou-se a um ginásio CrossFit e passou a fazer a dieta Paleo, que consiste principalmente de carne e legumes. Quando relaxou os seus padrões e tentou comer produtos à base de trigo novamente, notou uma diferença quase imediata. "Poucos minutos depois de comer, senti-me mal do estômago, fiquei inchado e sem energia. Isso só me fez sentir muito mal", diz Cheng, de 33 anos de idade. Assim, tem mantido o seu percurso sem glúten e, em Março, lançou o Green Spoon, um serviço que entrega refeições gourmet sem glúten às portas de 30 a 40 clientes locais a cada semana. Em Maio, a empresa ganhou o prémio de melhor entrada no concurso Taste of Arlington, por um prato de almôndegas mediterrânicas. Os pais de Cheng, que há muito trabalham em restaurantes chineses, estão bastante orgulhosos. E também um pouco perplexos. "Eles gostam que a empresa esteja bem", diz Cheng. "Mas, no fim, ainda gostam de comida chinesa. Eles adoram o glúten. "

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