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sexta-feira, 15 de junho de 2012

Testemunho " O Glúten e a Gravidez"

Imagem retirada da Net
O post de hoje é um relato em primeira mão dos possíveis efeitos da ingestão de glúten durante a gravidez em grávidas susceptíveis de intolerância a esta proteína. Aproveito para agradecer a colaboração da Ana Pimenta, a autora deste testemunho, por partilhar connosco a sua história de uma maneira tão completa. Num país em que a informação ainda não circula como deveria e a maioria dos médicos não está actualizada como deveria, são relatos como estes que podem ajudar mulheres em situações semelhantes a perceber o que se passa com elas. Obrigada Ana!


"Em Julho de 2010 uma nova “sementinha” pegou cá por casa… Novas aspirações…e muitas aventuras por vir!

A gravidez anterior tinha decorrido de forma impecável… Tirando náuseas e vómitos constantes! Lá para o fim dessa gravidez sempre que comia bolos, bolachas ou pão ficava com um sabor horrendo na boca. Brincava com o meu marido e dizia que o bebé não gostava de “amido”. Sobrevivi a iogurtes, leitinhos, queijinhos sempre com grande mau estar e vómitos infindáveis. Findo o parto nunca mais tal se verificou.

Nova gravidez vida nova… e que vida!

No segundo trimestre a barriga aumentou descomunalmente! O aumento de peso era insignificante e o bebé grande. Comecei a ter meteorismo e cólicas marcadas. O timpanismo abdominal era incrível…parecia um tamborzinho. Costumávamos brincar e dizíamos que o bebé era tão grande que empurrava de tal forma o intestino que este andava aprisionado: daí as cólicas.

Nos últimos quinze dias antes do parto e, por necessidade médica, tive de ficar em repouso absoluto. Não conseguia comer nada. O leite, esse, passei a regurgitá-lo! Tinha cólicas de tal forma intensas que, literalmente, chorava agarrada à cabeceira da cama. Claro que o culpado era o bebé que será com certeza “karateca”!

Após o parto e apesar de só ter aumentado 5,5 kg, o abdómen manteve-se com muito meteorismo. Era gozada por todos… parecia que nunca mais ia recuperar a forma. Ora isto não fazia sentido, não tinha aumentado de peso, recuperei de imediato o peso anterior e, tirando a barriguinha, até estava magra!

Amamentei com sucesso … bebé competente e mamã motivada – uma fórmula de sucesso! Nunca tinha tido tanta fome na minha vida. Chegava a beber uns 10 iogurtes por dia com reforços de queijinhos frescos, pãezinhos e bolachinhas pelo meio.

Progressivamente as minhas cólicas foram aumentando. A flacidez abdominal (posteriormente descoberto de causa neurológica) mantinha-se de tal modo que as ansas intestinais doridas e distendidas pareciam flutuar dentro de mim.

Este quadro durou uns 3 meses. Mantinha obstipação mas, com episódios de esteatorreia. Até que surgiu diarreia tipo tropical…parecia ter regressado de uma viagem ao norte de África!

Comecei a associar as cólicas ao leite e a suspeitei que tinha intolerância à lactose. Daí a pensar que também tinha intolerância ao glúten foi um pulinho! A última ingestão de uma fabulosa fatia de pão alentejano quentinho e acabado de sair do forno foi desastrosa … quase derreti e fiquei sem iões.

A gravidez, grande desafio imunológico que é, pregou-me uma partida*. Em vez de me trazer um só presentinho, trouxe-me dois… O Pedro e a doença celíaca.

Inverti a marcha diagnóstica / terapêutica… Optei por não realizar biopsia intestinal e pesquisa de anticorpos específicos antes de iniciar a dieta sem glúten. Estava envolta em tantos outros problemas de saúde que, na verdade, a doença celíaca, da qual estava segura, era apenas mais uma pedrinha no sapatinho.

Procurei uma dietista, e iniciei dieta isenta de glúten e lactose. As melhoras foram lentas, mas graduais.

Passados 10 meses de dieta sem glúten consigo associar com precisão os sintomas que derivam do glúten (diarreia, meteorismo, cólicas abdominais, cefaleias e astenia), e quais se devem à lactose (diarreia, flatulência, cólicas abdominais intensíssimas e marcado meteorismo).

A biopsia, 10 meses passados com dieta sem glúten, ainda mostrava ligeiros sinais sugestivos de doença celíaca e os anticorpos foram negativos. Contudo, e mais importante, a clínica estava e sempre esteve lá. Foi como juntar as peças de um pequeno puzzle:

Ainda eu andava na faculdade (hmmmm…há uns bons aninhos atrás…na verdade umas duas décadas!) e ocasionalmente surgiam “bagos de arroz” nas fezes. Primeiro pensei em parasitas, mas a pesquisa destes foi negativa. Ficou a má absorção de gorduras … não fazia sentido…não tinha qualquer outro sintoma. Fiquei sempre com uma pulguinha atrás da orelha.

Na primeira gravidez surgiu bócio embora eutiroideu e as náuseas e vómitos (emese gravídica? intolerância ao glúten e lactose?). Tive zona por duas vezes. Mais uma vez, desconcertante. Outra pulguinha atrás da orelha … mas o que se passaria com a minha imunidade? (Só por causa da gravidez não fazia sentido!). Antes da última gravidez alguns marcadores imunológicos inespecíficos positivaram. Segunda gravidez … zona novamente … e … Bingo … doença celíaca instalada.

Bendita dieta! Pelo meio houve muitos erros. Na verdade, continuo a aprender diariamente.

Citando Kathleen Moris, autora de “Amazing Grace " –  Life is easier to take than you think; all that is necessary is to accept the impossible, do without the indispensable and bear the intolerable!”.
* O efeito da gravidez na doença celíaca

Existe preocupação sobre a reactivação ou o desmascarar de doença celíaca não diagnosticada durante a gravidez e no período pós parto. Vários autores relataram casos em que a doença celíaca foi diagnosticada apenas após o parto.  

Malnick et al 1 relatou 3 casos nos quais mulheres previamente saudáveis apresentaram diarreia, perda ponderal e má absorção após o parto e por doença celíaca de novo. Também, Corrado et al 2 relatou 10 casos de doença celíaca diagnosticada durante a gravidez.

O surgir de doenças auto-imunes durante a gravidez (artrite reumatoide, Lupus eritematoso sistémico e outras conectivites) não é tão raro como se possa pensar. É, no entanto, necessário elevado nível de suspeição clínica para efetuar diagnóstico precoce e preciso.

1.     Malnick SD, Atali M, Lurie Y, et al: Celiac sprue presenting during the puerperium: A report of three cases and a review of the literature. J Clin Gastroenterol 1998;26:164–166
2.     Corrado F, Magazzu G, Sferlazzas C: Diagnosis of celiac disease in pregnancy and puerperium: Think about it. Acta Obstet Gynecol Scand 2002;81:180–181"

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