O post de hoje traz um artigo do número actual da revista norte-americana Time e que reúne as pesquisas mais recentes feitas sobre os factores desencadeantes da doença celíaca, algo que já tinha sido abordado aqui. Por coincidência, ou talvez não, a revista New Yorker traz também no seu mais recente número um artigo muito interessante e longo sobre a mesma temática.
"O aumento da doença
celíaca ainda surpreende os cientistas
Este é o seu intestino com glúten
Dois novos estudos no New
England Journal of Medicine abalaram o mundo da investigação celíaca, ambos
provando que os cientistas ainda têm um caminho a percorrer na sua compreensão
da doença celíaca e que afecta cerca de 1% da população, quer eles saibam disso
ou não.
Um estudo
italiano perguntou se a idade em que o glúten é introduzido na dieta pode
afectar a probabilidade de uma pessoa desenvolver esta doença auto-imune, pelo
que mantiveram o glúten longe de recém-nascidos durante um ano. Para choque dos
investigadores, atrasar a exposição ao glúten não fez diferença a longo prazo.
Em alguns casos, atrasou o início da doença, mas não impediu as pessoas de a
desenvolverem, para a qual não existe cura.
O segundo estudo,
com cerca de mil crianças, introduziu pequenas quantidades de glúten nas dietas
das crianças amamentadas, para ver se isto promovia uma tolerância ao glúten a posteriori, naquelas geneticamente
predispostas à doença celíaca. Também não tiveram essa sorte. Embora ambos
estudos tivessem sido excelentemente concebidos e executados, diz o Dr. Joseph
A. Murray, professor de medicina e gastrenterologista da Mayo Clinic, em Rochester, foram cada um "um fracasso espectacular."
O que tem o glúten que leva tantas pessoas a contorcer-se de
dor? Como poderia o inocente e antigo acto de partir o pão, ser tão
problemático para alguns?
É uma pergunta a que os investigadores estão activamente a tentar
responder. "Eu acho que a doença celíaca agora é mais uma questão de saúde
pública", diz o Dr. Murray. Ele está a pesquisar a proteína do pão há mais
de 20 anos e tem visto a incidência da doença celíaca aumentar dramaticamente; esta
é quatro vezes mais comum do que era há 50 anos atrás, de acordo com a sua pesquisa,
publicada na revista Gastroenterology.
Mesmo que os métodos de sensibilização e testes tenham melhorado drasticamente,
eles não podem, por si só, explicar o aumento, diz ele.
Cerca de 1% dos americanos têm doença celíaca, e é
especialmente comum entre os caucasianos. Há uma forte componente genética, mas
ainda não é evidente porque algumas pessoas desenvolvem esta doença e outras
pessoas não. Parece afectar pessoas de todas as idades, mesmo que tenham comido
trigo durante décadas. E não se pode culpar o aumento do consumo desse item; dados
do USDA mostram que não estamos a comer mais disso.
Algo mais no meio ambiente deve ser o culpado, e teorias
abundam sobre os possíveis factores, desde cesarianas ao uso
excessivo de antibióticos, assim como a hipótese da higiene que sugere que, à
medida que o nosso meio ambiente tornou-se mais limpo, o nosso sistema
imunológico tem menos que fazer e por isso vira-se contra si próprio- e contra
alimentos específicos como o glúten- como uma distração.
Ou talvez haja algo realmente diferente no glúten. A semente
de trigo não mudou assim tanto, mas a forma como processamos e preparamos os
produtos com glúten mudou sim, diz o Dr. Murray. "Houve alguns pequenos
estudos que olharam para as antigas formas de panificação... E que sugeriram
que estas não eram tão imunogénicas, não produziam uma resposta imune tão forte
como acontece com técnicas de preparação de pão e grãos mais modernas",
diz o Dr. Murray.
Um pequeno estudo de 2007
descobriu que o pão sourdough quando
fermentado com bactérias, praticamente elimina o glúten, mas precisamos de muito
mais pesquisas antes que os verdadeiramente alérgicos possam experimentar uma
só fatia que seja.
O Dr. Alessio Fasano, director do Centro de Pesquisa Celíaca
e chefe da divisão de gastrenterologia pediátrica e nutrição no Massachusetts General Hospital for Children,
foi co-autor do estudo recente sobre a amamentação e o momento da introdução do
glúten. Diz que achou os "importantes e imprevisíveis resultados” chocantes.
A lição aprendida a partir desses estudos é que há algo para além do glúten no meio
ambiente que pode eventualmente fazer tombar as pessoas geneticamente
predispostas de tolerantes à resposta imune ao glúten, para desenvolverem a
doença celíaca ", diz.
Ele suspeita que isto pode resultar da maneira como a dieta
moderna, hiper-processada, influencia a composição das nossas bactérias intestinais.
"Estas bactérias comem o que nós comemos", diz o Dr. Fasano. "Temos
vindo a mudar radicalmente o nosso estilo de vida, especialmente a maneira como
comemos, rápida demais para os nossos genes se adaptarem." O Dr. Fasano
espera explorar o microbioma no seu próximo estudo, em que irá acompanhar
crianças desde o nascimento e procurar uma assinatura no seu microbioma que
preveja a activação dos genes avessos ao glúten, e que levam uma criança a
desenvolver a doença celíaca. A esperança, então, é que com uma intervenção através
do uso de probióticos ou prebióticos traga os problemáticos intestinos de
"beligerantes para amigáveis."
"Isso seria o Santo Graal da medicina preventiva",
diz."
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